Paulo David en «OS UNIVERSALISTAS – 50 años de arquitectura portuguesa»

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Uma arquitectura para reinventar o universalismo

Por Sérgio C. Andrade

11/04/2016 – 07:57

Os universalistas – 50 anos de arquitectura portuguesa é uma exposição que vai ser inaugurada esta terça-feira em Paris. Nuno Grande é o comissário da mostra, que continua a assinalar o meio século da presença da Fundação Gulbenkian na capital francesa.

A sede da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, projectada pelos arquitectos Alberto Pessoa, Ruy d’Athouguia e Pedro Cid; o Estádio do Povo, em Bagdad (Francisco Keil do Amaral e Carlos Manuel Ramos); a Embaixada de Portugal em Brasília (Raul Chorão Ramalho); a Igreja da Machava, em Maputo (Pancho Guedes); o Orfanato Helen Liang, em Macau (Manuel Vicente); o Edifício Bonjour Tristesse, em Berlim (Álvaro Siza); a sede do Governo do Brabante Flamengo, na Bélgica (Gonçalo Byrne); o Teatro-Auditório de Poitiers, em França (João Luís Carrilho da Graça); o Museu da Fundação Iberê Camargo, no Brasil (Álvaro Siza); o Crematório de Uitzicht, na Bélgica (Eduardo Souto de Moura). Dez exemplos de como a arquitectura portuguesa é universalista. É-o não apenas porque está presente nos quatro cantos do mundo, mas porque simultaneamente expressa uma autoria portuguesa e adequa-se ao lugar e à cultura que a encomendou e acolhe.

Este é o princípio aglutinador das 50 obras com que o arquitecto e professor Nuno Grande (n. Luanda, 1966) quis contar a história do último meio século da arquitectura portuguesa, numa exposição que esta terça-feira é inaugurada em Paris, na Cité de l’Architecture & du Patrimoine, mesmo em frente à Torre Eiffel.

Trata-se de mais uma iniciativa do programa com que, desde o ano passado, a Gulbenkian vem assinalando os 50 anos da inauguração da sua delegação na capital francesa, e que na próxima semana, a 20 de Abril, se prolongará com a retrospectiva da obra de Amadeo de Souza-Cardoso, no Grand Palais.

O comissário da exposição de arquitectura chamou-lhe, de resto, Os universalistas. Mas com “u” minúsculo. Por um lado, retomando “a relação aberta que os portugueses têm com o mundo” e que esteve expressa em diferentes momentos da História, desde os Descobrimentos até ao fenómeno da emigração, passando pela colonização e pela diáspora, e com expressões que “chegam à literatura e ao cinema”, nota Nuno Grande, lembrando textos de Agostinho da Silva, José Gil e Eduardo Lourenço, ou os filmes de Manoel de Oliveira e de Miguel Gomes.

Mas “universalistas” também por contraposição com o correspondente francês deste conceito fundado com o iluminismo do século XVIII, e que “de alguma maneira foi imposto de cima para baixo, o que hoje já não colhe”, acrescenta Nuno Grande ao PÚBLICO, exemplificando com a perda de influência que a França vem sofrendo no contexto geopolítico mundial.

“É preciso repensar a ideia de cidadãos que vem da Revolução Francesa; nós não queremos ser todos iguais; o que é interessante, hoje, na Europa, é cultivar as diferenças culturais entre os vários países”, diz o comissário, chamando a atenção para o esgotamento do modelo francês. “Esta exposição tenta, de uma forma algo provocadora, interpelar e questionar a arquitectura francesa, e a França, a partir [da produção arquitectónica] deste povo pequenino do canto sul da Europa”, que historicamente se tornou universalista “por defeito”, como explica Eduardo Lourenço.

O filósofo e ensaísta é, de resto, uma espécie de “guia” desta exposição, através de uma selecção de textos e entrevistas que Nuno Grande dispôs no percurso da mostra que vai ocupar 450 metros quadrados na Cité de l’Architecture – e cujo auditório vai acolher esta segunda-feira um colóquio com vários críticos portugueses e franceses, e alguns dos arquitectos representados em Les universalistes.

Os últimos 50 anos da arquitectura portuguesa serão mostrados numa selecção de documentos, reproduções de projectos originais e plantas, fotografias, e ainda uma série de caricaturas de João Abel Manta e um diaporama fotográfico de Alfredo Cunha, que contam a história do país desde a década de 1960.

A exposição inclui ainda a edição de um catálogo com as obras representadas, e com textos de arquitectos, historiadores e críticos portugueses (Ana Tostões, Ana Vaz Milheiro, José António Bandeirinha, Jorge Figueira e Ricardo Carvalho) e franceses (Francis Rambert, director do Instituto Francês da Arquitectura, Jean-Louis Cohen, Dominique Machabert e Jacques Lucan).